Toda reforma interior e toda mudança para melhor
dependem exclusivamente da aplicação do nosso próprio esforço. - Immanuel
Kant
Após
tanto tempo tentando se recordar do que realmente estava fazendo ali, chegou à
conclusão de que não tinha nem sentido nem direção. Era um projétil lançado no vácuo. Sentia pena
de si e tentava ofuscar isso em atitudes que o fizessem se sentir capaz, apesar
dele saber que não era. Coitado, um pobre coitado. Não tinha endereço
psicológico fixo, sempre mudava, mas não saía do mesmo. Entendes? Não? Nem eu.
Nem ele. Ah, bem, esqueci-me de continuar a apresentá-lo. Além de inconstante e
perdido era rejeitado. Mas não me digas que ele era bem aceito, por favor, pois
ele não era. Devo concordar que sempre foi um dos que recebiam os melhores
tratamentos, já que tratava a qualquer um da melhor maneira possível, mas não
era visto como achava que deveria ser. Nada muito espalhafatoso e gritante, mas
algo mais simples, talvez um pouco mais além de um “Oi, tudo bem?”. Mas não, não se culpe, ele nunca manifestou
necessidade disso, não é? Sei que não, era muito sem defeitos para demonstrar
tamanha carência interior. Carente, isso sim ele era, entretanto supria isso da
melhor forma que sabia, ajudando aos outros. Era só falar, lá estava ele. Era
sonhador, queria melhorar o mundo por si só e agarrava a essa ideia de todas as
maneiras. Pobre coitado, fazia tanto e ao mesmo tempo não fazia nada. Tanto
para tantos e nada para ele. Mas estava decidido a por fim a isso tudo e
resolveu deixar seus horários e seguir sem direção, dessa vez fisicamente.
Andou quilômetros e mais quilômetros até se dar conta que não era assim, não
era o que ele queria. Para ser sincero, ele queria poder rasgar a si próprio
até ficar em pedacinhos, porque queria que os outros o vissem como era, e ele
era assim. Contudo não conseguiria fazer isso, e estava triste, ou era triste,
não sei ao certo. Pois bem, fez uma
revista em seu passado e em suas atitudes passadas e tudo se demonstrava na
mais perfeita ordem. Por que sempre tão correto? Não sabia nem ao menos o
motivo de tantas ações socialmente elogiáveis. Mas ele realmente gostava
daquilo, gostava de se sentir útil aos outros, até porque não era útil para si próprio.
Refletiu mais um pouco e viu que alguma coisa nele fazia sentido. Ele gostava
de ser ele, pelo menos um pouco. Que fosse um perdido para os alheios, mas que
estivesse pleno de si, era esse o ponto no qual iria se assegurar. Firmou-se
nisso e voltou, agora decidido a se auto-afirmar. E fez isso. Descobriu-se a
cada dia um pouco e passou a se olhar de maneira diferente. Dizia que, depois
de tanto refletir sobre sua vida, não queria ter que por fim à ela e resolveu
solucionar seus problemas da maneira mais simples que sabia. Por um tempo bem
que ele conseguiu, mas, mais do que conseguir, ele pode conviver com si mesmo
sem se achar um estranho desesperado por salvação. Contudo, mesmo assim, ele
sabe que no fundo o estranho continua lá, com uma grande quantidade de espaço
reduzida, mas à espera de algum imprevisto para entrar em ação e ser revogado,
pois disso ele era feito, e isso era o que ele não queria aceitar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário